EBD

O Ensino Bíblico Gravuras

 

CURSO BÍBLICO: INTEGRALIDADE DO SER

 

Prof. Eliseu Pereira (eliseugp@yahoo.com.br)

LIÇÃO 4 —  O DILEMA CARNE X ESPÍRITO

A CARNE (1ª parte) 

Textos: “... a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis” (Gl 5.17).

 

[1]          INTRODUÇÃO

a.      Lei de Deus: por ser criado à imagem de Deus, o homem está sob a lei de Deus, isto é, tem conhecimento do bem e do mal — noção moral.

b.      Lei do pecado: todos os homens caíram em pecado e estão sob a lei do pecado; em todos os homens se observa o fenômeno do erro (“todos pecaram” Rm 3.23).

c.      Dilema: a tensão entre a imposição da lei do pecado e a obrigação perante a lei de Deus é a raiz da fragmentação do ser humano (Rm 7.22,23,25;8.2,7).

d.      Objetivo: definir os termos bíblicos de carne e espírito e analisar a extensão de pecado e a grandeza da salvação provida por Deus em Cristo.

 

[2]          FRAGMENTAÇÃO — DILEMA HUMANO

a.      Dilema Humano: todo homem vive em estado de tensão interior; não significa duas partes em luta, mas dois princípios (ou governos).

               i.Experiência pessoal: é reconhecido na experiência individual de todos os homens;

             ii.Ciências Humanas: é reconhecido por todas as ciências humanas (psicologia, medicina, etc) e pela filosofia em geral, sem que haja uma resposta satisfatória.

b.      Filosofia grega: cisões entre corpo/alma, sentidos/razão, paixão/virtude.

               i.Epicteto (100 aC): "Aquilo que quero eu não faço, mas o que não quero eu faço". 

             ii.Ovídio (14 d.C.): "Eu vejo o que é melhor e o aprovo; mas sigo o que é pior".

c.      Psicologia freudiana: teoria da personalidade — id (impulsos brutos), ego (‘eu’ que faz contato com o mundo real) e superego (censor do ego e inibidor do id).

d.      Psicologia jungiana: o self (eu) não tem força para determinar a ação.

e.      Visão bíblico-teológica: a Teologia situa a raiz do dilema humano em uma esfera que nenhuma ciência poderia vislumbrar, isto é, o pecado.

 

[3]          CONCEITO BÍBLICO DE FRAGMENTAÇÃO — CARNE X ESPÍRITO (Gl 5.16)

a.      Teologia de Paulo: a mente pode reconhecer o que é certo, mas não dispõe de poder para superar a vontade (Rm 7.20); a pessoa não entende porque age de modo contrário ao que pretende.

               i.Agostinho: “Quando pensava em me consagrar por inteiro ao Teu serviço, Deus meu, era eu quem queria fazê-lo, e eu quem não queria fazê-lo, era eu mesmo, e porque não te queria de todo, nem de todo não te queria, lutava comigo mesmo e me rasgava em pedaços.”

             ii.Martinho Lutero: homem é “simul justus et peccator” (o homem é, ao mesmo tempo, santo e pecador).

b.      Pecado: hamartia ou hamarto (grego) errar, falhar, não atingir o alvo; vício; força que produz o defeito, erro em todas as ações humanas; impede o viver racional.

c.      Oposição: a carne e o espírito como duas leis opostas entre si (Gl 3.3; 1Pe 3.18); naturezas opostas e inconciliáveis; uma exclui a outra.

               i.“a carne milita contra o Espírito e o Espírito contra a carne, porque são opostos entre si; para que porventura não façais o que seja do vosso querer” (Gl 5.17).

             ii.“por isso o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus nem mesmo pode estar” (Rm 8.7).

d.      Carne/Espírito: do ponto vista bíblico-teológico, a raiz do dilema humano é a rejeição do governo de Deus e da natureza humana físico/espiritual; a lei do pecado, também chamada de “carne”, vigora implacavelmente sobre todos os seres humanos (isto é, “todos pecaram” — Rm 3.23) e sobre o ser humano todo (isto, “em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum” — Rm 7.18).

 

[4]          CONCEITO BÍBLICO DE ‘CARNE’

a.      carne como sinônimo de humanidade: “toda a carne verá a salvação de Deus”  (Lc 6.3); “Derramarei do meu Espírito sobre toda a carne” (At 2.17); “Toda a carne é como a flor da erva” (1Pe 1.24). 

b.      carne sinônimo de corpo físico: sarx (grego), corpo físico como oposto ao espírito/alma, isto é, o material versus o imaterial; “um espírito não tem carne nem ossos” (Lc 24.39)

               i.Citações: “E o Verbo se fez carne” (Jo 1.14;Rm 1.3; 1Tm 3.16; Hb 5.7; 1Jo 4.2,3); “não foi carne e sangue quem to revelou” (Mt 16.17);

             ii.outros exemplos: Mt 24.22; 26.41; Gl 1.16; Ef 6.5,12; Fp 1.22,24; 1 Tm 3.16; Hb 5.7; 12.9; 1Pe 1.24;4.1,2.

c.      carne como sinônimo de pecaminosidade: sarx, sarkikós ou sarkinós (grego), natureza humana separa da influência divina e, portanto inclinada ao pecado e oposta a Deus (Thayer); a natureza humana com suas paixões e fragilidades físicas e morais (Strong); governo da natureza humana, sem o Espírito de Deus.

               i.Citações: “Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também” (Ef 2.1-3); “não tem valor algum contra a sensualidade [carne]” (Cl 2.23);

             ii.outros exemplos: Gl 5.16,17,19,24; 6.8; Fp 3.3,4; Cl 2.23.

d.      Análise do conceito em textos bíblicos:

               i.Problema: Em Gl 5.19, Paulo dia que “as obras da carne são: adultério, prostituição...” Em Mt 15.19, Jesus diz que “do coração procedem... adultérios, prostituição...” Corpo peca? adultera? prostitui? Ou é o coração que concebe o adultério e a prostituição?

Solução: esta comparação de termos mostra claramente que carne significa o coração agindo sob o domínio do pecado.

             ii.Problema: em Romanos 8.9 e Gálatas 5.16, Paulo diz que não devemos andar na carne; em 1Co 10.3, ele diz que anda na carne. “Porque, andando na carne [corpo físico], não militamos segundo a carne [pecado]”

Solução: Paulo quer dizer que, embora vivamos como seres humanos físicos, não devemos andar segundo os impulsos do pecado, mas segundo o Espírito.

           iii.Problema: em Rm 7.5, Paulo diz “quando estávamos na carne” referindo-se ao passado; em Gl 2.20, ele diz “o viver que vivo na carne”, referindo-se ao presente;

Solução: Paulo contrasta o “antes segundo a carne” com o “agora em novidade de vida” uma vez que fomos libertos da lei do pecado (7.6). Assim ele iguala a lei do pecado como sinônimo de carnalidade (pecaminosidade).

            iv.Problema: Em João 3.6, Jesus diz que: “O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito”; mas o homem natural é carne-espírito e o homem espiritual também é carne-espírito.

Solução: Jesus quer dizer que o homem natural é dirigido pelo pecado e jamais se tornará espiritual e que o homem espiritual é dirigido pelo Espírito (Jo 3.8).

e.     Resumo:

               i.A carne no sentido ético/moral se refere ao homem como um todo (corpo, alma e espírito) no seu estado apartado de Deus;

             ii.Viver na carne é rejeitar o governo de Deus (“é assim que Deus disse?” – Gn 3.1) e a natureza humana como sendo criada, dependente e físico/espiritual.

           iii.A carne produz fragmentação (des-integridade) porque visa satisfazer impulsos que não levam em conta a natureza físico/espiritual do homem, mas apenas os apetites físicos e imediatos.

 

[5]          PARA REFLETIR

a.      o pecado significa pelo menos suas coisas:

               i.negação da posição do homem em relação a Deus (dependência e submissão) e

             ii.negação da própria natureza do homem (matéria/carne e matéria/espírito).

b.      o espírito humano, o fôlego de Deus em nós, representa pelo menos duas coisas:

               i.a vida cedida a nós da parte de Deus e

             ii.a imagem de Deus.

c.      negligenciar a natureza espiritual implica em pelo menos duas coisas:

               i.morte espiritual e depois física (porque Deus é a fonte da vida), e

             ii.culpa, uma vez que o estado de pecado não nos dispensa do dever moral perante Deus.

d.      Pensando nisto, viver segundo a "carne" (em pecado) significa pelo menos duas coisas:

               i.negar a relação com Deus, isto é, viver por sua própria conta, e

             ii.a nossa natureza, isto é, satisfazer apenas os impulsos físicos-materiais.